Atlético-MG, Cruzeiro

O impedimento da mulher

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Fernanda Colombo, assistente do clássico entre Atlético x Cruzeiro, se equivocou ao marcar impedimento de Alisson em um dos lances capitais da partida. Acompanhou a corrida de Marcelo Moreno, adiantado, e cometeu um erro crasso.

Nada que justifique, porém, a declaração do diretor cruzeirense Alexandre Mattos após a vitória do rival: “Essa bandeira é bonitinha, mas não está preparada. Se é bonitinha, que vá posar para a [revista] Playboy.”

Mattos é bom dirigente, um dos responsáveis pelo último título brasileiro do clube, mas tropeçou feio. Um comentário infeliz que só reforça o machismo descarado do futebol.

Fosse um homem no lugar de Fernanda, Mattos não recorreria a seus atributos físicos para criticá-lo. Em abril, a assistente Maira Americano Labes também foi alvo de insultos machistas do técnico do Juventus-SC, Celso Teixeira, que havia sido expulso da partida.

Toda vez que um homem ressalta os “traços femininos” de uma mulher em detrimento de suas virtudes (e deméritos) profissionais, seja no futebol ou em qualquer outro meio, trata de reduzi-la a uma posição inferior e de subserviência.

fernanda_colombo_machismo

A declaração de Alexandre Mattos soa como um alerta inescrupuloso: “Cara Fernanda, você é mulher.  E mulheres não são bem-vindas no futebol. Lembre-se disso”.

No entanto, Fernanda deve ser julgada exclusivamente por sua atuação, não por seus atributos físicos. Erros devem ser relacionados a sua qualificação, não à suposta condição de “sexo frágil” em meio a gladiadores brutamontes.

Aliás, se fosse tão despreparada como Mattos rotulou, ela não teria chegado ao quadro de aspirantes da Fifa. A tentativa de desqualificar a competência da mulher no futebol é torpe e vem de longa data.

Em 2007, a ex-auxiliar Ana Paula Oliveira posou nua para a revista Playboy e, a partir dali, viu sua carreira declinar. Ao contrário dela, ex-jogadores como Vampeta e Roger Noronha posaram nus para a G Magazine e seguiram jogando normalmente. Curioso, não?

Ontem à noite, o jornal Extra estampou a seguinte manchete Bandeirinha musa Fernanda Colombo é clicada em pose indiscreta em clássico mineiro, seguida de uma imagem da assistente agachando-se no gramado.

O mesmo gesto de um bandeirinha, de um homem, teria alcançado tamanho destaque? O erro de um homem teria gerado a mesma reação de Mattos? Definitivamente, não. Porque, no futebol, o homem que erra é incompetente. A mulher que erra é… mulher.

Como se o fato de ser mulher fosse uma limitação, uma deficiência.

Cara Fernanda, levante a cabeça, treine e prepare-se mais para errar menos. Que daqui para frente você seja elogiada ou criticada pelo que fizer com a bandeira na mão. E perdoe os ignorantes que ainda acreditam que gênero e beleza sejam capazes de impedir qualquer pessoa de realizar uma profissão.

ATUALIZAÇÃO – 13/5 às 9h50

O diretor de futebol do Cruzeiro, Alexandre Mattos, entrou em contato com o blog nesta manhã. Ele reconhece que, após esfriar a cabeça, passada a derrota no clássico em que seu clube foi prejudicado por erros do apito, exagerou na crítica e pede desculpa à auxiliar Fernanda Colombo.

No entanto, ele segue colocando em xeque o processo de seleção de árbitros na comissão de arbitragem da CBF:

“Refletindo com mais calma depois do jogo, eu me dei conta do meu erro. Exagerei ao usar alguns termos para criticar a atuação da bandeirinha e peço desculpas se ela se sentiu ofendida. Não foi minha intenção. O que questiono é outra coisa. Como ela é muito jovem [23 anos] e já apitou um clássico do tamanho de Cruzeiro x Atlético, tenho a impressão de que estão forçando a barra para promovê-la, só porque é bonita, pra ver se cola. Ela já havia errado na semana anterior e acabou prejudicando o Cruzeiro em um jogo importante.” 


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Atlético-MG

Um Galo avassalador diante da paranoia do apito

O Atlético jogou melhor e ganhou na bola, merecidíssimo. Engoliu o Fluminense em todos os campos: físico, tático e técnico.

Ronaldinho espetacular, como de praxe no Independência. Bernard, impossível. Jô fez o papel do bom centroavante matador. Pierre e Leandro Donizete aniquilaram a criação tricolor. Leonardo Silva e Réver confirmaram a fama de melhor defesa do Brasil.

Mas não se deve culpar o árbitro pelo gol anulado. Tanto o lance de Edinho, contra o Vasco, quanto o de Leonardo Silva, diante do Fluminense, são faltosos.

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Dizer que esse tipo de falta não deveria ser marcado é legitimar o vale-tudo no futebol. Se é barreira, então, pode empurrar, chutar, socar?

Falta de critério da arbitragem? Ok. Problema crônico que atinge o apito no mundo inteiro. Porém, o que Jailson Macedo Freitas fez neste domingo foi aplicar a regra. Falta em barreira também é falta, ora.

O Brasil talvez seja o único país que produziu especialistas em comentar e analisar arbitragem. Hipervalorizamos a figura do árbitro e desconsideramos o erro casual.

Como dissera antes no blog, torcidas que chiam alegando complôs e supostos conluios da arbitragem também se alimentam dos erros para acossar rivais e absolver favorecimentos quando seu time é o beneficiado. Pimenta nos olhos dos outros é refresco. É o universo hermético do torcedor.

Quando esse espírito contamina dirigentes, técnicos e jogadores, a coisa descamba para a abstração da hipocrisia. E é danosa à imagem do futebol.

O Fluminense, tantas vezes beneficiado por erros de arbitragem no Brasileirão, saiu na bronca com o árbitro. O Atlético, que viu o Fluminense ter um gol anulado no jogo do primeiro turno, já entrou em campo com a pilha da conspiração, culpou Jailson Freitas por uma falta de critério que não é dele e, automaticamente, condicionou a vantagem do rival às mancadas dos apitadores.

Atribuir aos mediadores do espetáculo o protagonismo que sempre coube aos atores que produzem gols, genialidades e faltas na barreira é um atentado à grandeza do jogaço de ontem.

Atlético-MG

Choro inimigo

Acaba o jogo, vitória do Corinthians, e o presidente do Atlético, Alexandre Kalil, vocifera no Twitter: “Quando um bandeira erra contra o Corinthians, a comissão de arbitragem cai inteira. Vamos ver o que vai acontecer agora.”

Quanta hipocrisia, Kalil. Se puxar rapidamente pela memória, o dirigente atleticano irá se lembrar de pelo menos duas ocasiões em que seu time foi beneficiado por erros de arbitragem neste Brasileirão.

E quando Jô tropeçou sozinho contra o Náutico? Pênalti marcado e convertido para desempatar o jogo. E contra o Fluminense? Gol de Fred anulado por impedimento mal assinalado. O Galo saiu com um empate generoso do Engenhão.

Cuca, que também culpou o apito pela derrota de ontem, foi o mesmo que desconversou ao ser questionado a respeito do lance polêmico contra o tricolor carioca, dizendo que o empate havia sido justo. O mesmo, inclusive, que jogou panos quentes sobre os erros dos bandeiras que, de forma equivocada, anularam dois gols do Atlético diante do Santos. Como seu time venceu por 2 x 0, Cuca preferiu absolver a arbitragem.

É isso que torna o chororô deplorável. A queixa em torno dos árbitros virou muleta para justificar derrotas. Semana passada conversei com o inglês Tim Vickery, correspondente da BBC no Brasil há quase 20 anos. Compartilho de sua frustração com o futebol brasileiro. Para ele, a obsessão que envolve a arbitragem no país ofusca o espetáculo, coloca clubes em descrédito. A maioria deles convive com a sombra de uma ilusória conspiração do apito.

Tal qual a lamúria de Kalil, é patético ver o Vasco detonar o árbitro ao perder para o Atlético no Independência, em jogo com erros para os dois lados. Assim como na partida de ontem. Ou o lance da expulsão de Emerson foi inconteste? Ou o impedimento mal marcado de Leonardo Silva encobre a falta (também questionável, obviamente) do zagueiro sobre Fábio Santos?

A arbitragem brasileira erra demais. Porém, sem dúvidas, é muito mais preparada e profissional do que dez, vinte anos atrás.

O Galo ainda ressente de juizadas grosseiras que lhe valeram a perda de títulos nas décadas de 70 e 80. Mas os tempos mudaram. Supostos complôs e armações não servem como justificativa para os tropeços do time, que hoje lidera o Brasileiro. O choro é livre, entretanto, despropositado, demagogo. Um complexo de eterno prejudicado que bota a pilha errada em um dos Atléticos mais promissores dos últimos anos.